Capital tem duas residências que funcionam de abrigo para pessoas desamparadas pelas famílias por questões de gênero
Apesar de inúmeros pedidos, casas não conseguem acolher todos por falta de verba e sem as casas de acolhimento LGBTQIA+ no Brasil, muitas pessoas não teriam para onde ir depois de serem expulsas de suas famílias. É o caso de Juliana de Paula. Ao contar para os pais sobre sua identidade de gênero, ela sofreu queimaduras após eles jogarem óleo quente em seu corpo.
Hoje, fora de casa, ela frequenta a Casa Rosa, em Sobradinho, no Distrito Federal. Juliana não mora no local, mas todos os dias participa das atividades oferecidas pelo grupo. Ela aprendeu a costurar e a fazer ovos de Páscoa, em oficinas desenvolvidas pela casa, e guarda boas lembranças de eventos culturais que participou com outros acolhidos.
A casa, que é uma das duas em funcionamento no DF, tem três moradores LGTBQIA+. No entanto, Pedro Gustavo Matias, coordenador pedagógico da Casa Rosa, ressalta que, mesmo recebendo uma média de quatro a cinco mensagens por dia, de pessoas do DF e de outros estados, não consegue acolher mais ninguém.
“Todos os dias a gente recebe solicitações. As pessoas nos procuram, mandam mensagens no Instagram, no WhatsApp, só que a gente não está tendo condições de fazer novos acolhimentos”, destaca Matias. O principal motivo é a falta de recursos. De acordo com Pedro, para manter a casa em funcionamento com seis pessoas, a manutenção mensal chega a R$ 30 mil. O dinheiro, além de todos os móveis e eletrodomésticos da casa, são fruto de doações.
Quem trabalha no local é voluntário. Ao todo, são 30 atuantes. Pedro espera que o governo federal elabore uma política pública eficiente, que integre as casas de acolhimento e apoie as ações, para aumentar os atendimentos. O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania afirmou não saber quantas casas de acolhimento para pessoas LGBTQIA+ existem no país, pois a pasta passa por reestruturação.
A Casa Rosa, que funciona desde 2017 e já atendeu 18 pessoas, recebeu recursos do governo do DF pela primeira vez este ano. Fruto de emendas parlamentares e parceria com a Secretaria de Cultura, o recurso foi destinado para dois cursos: de corte e costura, e de iluminação para o palco.
Situação no Brasil
Segundo Alberto Silva, responsável pela Casa Florescer, em São Paulo, a situação da maioria das casas do país é semelhante à Casa Rosa, no DF: poucos recursos.
“A maioria, que não tem apoio do poder público, trabalha através de captação de recursos, fazendo algumas ações para arrecadar fundos. Sobrevivem de apoio de empresas, de articulações coletivas, aí entram doações, insumos, alimentação, itens de higiene pessoal, cama e banho”, diz Silva. Na Florescer, que funciona desde 2016, são atendidas 30 pessoas atualmente. Ao todo, já passaram cerca de 1.100 pessoas. Desse total, 220 pessoas conseguiram autonomia e realocação no mercado de trabalho.
A casa recebe recursos da parceria entre a Coordenação Regional das Obras de Promoção Humana e da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo.
Confira abaixo algumas casas em funcionamento no país:
Casas de acolhimento LGBTQIA+ em funcionamento no país
Nome da casa | UF |
Casa Rosa | DF |
Casa Florescer | SP |
CasaNem | RJ |
Casa 1 | SP |
Casa Amiga | AM |
Casa Marielle Franco | BA |
Casa Amor | BA |
Instituto Transviver | PE |
Casa Florescer | MA |
Casa Sem Preconceitos | SP |
Casa João Nery | PB |
Casarão Brasil | SP |
Casa Chama | SP |
Casa Atrevida | RN |
Casa Amor | SE |
Casinha | RJ |
No Brasil, houve uma morte de pessoas LGBTQIA+ a cada 34 horas, em 2022. Os dados são do Observatório do Grupo Gay da Bahia (GGB). Ao todo, 256 pessoas morreram: foram 242 homicídios (94,5%) e 14 suicídios (5,4%).
O Brasil continua sendo o país mais pessoas LGBTQIA+ são assassinadas no mundo. Enquanto nos Estados Unidos, 32 pessoas transexuais foram assassinadas, no Brasil, foram 114 — uma a cada três dias.
Os dados são obtidos por meio de notícias publicadas em meios de comunicação. A pesquisa é realizada há 43 anos pelo grupo baiano. No entanto, eles ressaltam que os números de violência homotransfóbica podem ser bem maiores, já que muitos casos deixam de ser registrados pela imprensa.
A maioria das mortes de 2022, de acordo com o levantamento, foram de pessoas negras – pretas (14,84%) e pardas (46,87%) – seguidas por pessoas brancas (37,11) e amarelas (1,17%). Além disso, a maioria dos crimes ocorreu dentro das casas das vítimas. Confira na tabela abaixo:
Local do crime contra pessoas LGBTQIA+ em 2022
Local da morte | Número de pessoas |
Residência | 108 |
Rua | 76 |
Matagal/Terreno baldio | 20 |
Rio/Açude/Represa/Praia | 10 |
Hotel/Motel/Pousada | 8 |
Rodovias/Estradas | 8 |
Bar/Boate/Clube | 6 |
Hospital | 3 |
Outros locais | 17 |
Total | 256 |